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STF reconsidera parcialmente liminar sobre expansão irregular de cursos por instituições municipais

O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconsiderou em parte a liminar proferida no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1247, ajuizada pela Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (AMIES). A nova decisão, publicada em 15 de setembro, ajusta os efeitos da medida cautelar anteriormente concedida.

Na decisão inicial, de 28 de agosto, havia sido determinada a suspensão do ingresso de novos alunos em instituições de ensino superior municipais que cobram mensalidades e atuam fora do município-sede. Agora, em sede de Embargos de Declaração, o ministro reviu parcialmente esse alcance, autorizando novas matrículas em cursos e campi já existentes e em funcionamento, vinculados a instituições criadas antes da Constituição de 1988 – situação amparada pela exceção prevista no artigo 242 da Carta Magna.

“Fica temporariamente autorizada, portanto – nos estabelecimentos de ensino beneficiados pelo art. 242, caput, da Constituição —, a realização de novas matrículas nos cursos e unidades (campi), que estejam efetivamente já em funcionamento, situados dentro ou fora do município-sede, inclusive a cobrança de mensalidades”, decidiu o ministro Flávio Dino, que também esclareceu que a autorização não se aplica aos cursos já criados mas que não estejam funcionando efetivamente fora da sede municipal.

O despacho, porém, manteve vedada a criação, autorização e reconhecimento de novos cursos e/ou campi fora da sede do município de origem. Para as instituições municipais criadas após 1988, segue proibida a cobrança de mensalidades, em respeito ao princípio da gratuidade do ensino público.

O ministro ressaltou que a suspensão total das matrículas poderia gerar risco de inviabilidade financeira para unidades em funcionamento e causar prejuízos ao corpo docente e discente. “Desse modo, e reiterando a finalidade de evitar danos irreparáveis ao sistema educacional, com eventual desequilíbrio financeiro, notadamente em relação ao nível superior, impõe-se reconsiderar o alcance da liminar anteriormente deferida, de modo a evitar prejuízos a situações atualmente existentes, constituídas com base na boa-fé dos destinatários dos serviços educacionais questionados e na confiança dos gestores das instituições de ensino na legalidade e legitimidade dos atos da Administração Pública, em especial dos Conselhos Estaduais de Educação”, justificou.

Flávio Dino também determinou que o Ministério da Educação (MEC) apresente informações e pareceres técnicos sobre os pontos em controvérsia, reforçando a análise do mérito que será submetida ao Plenário do STF.

O julgamento virtual da medida cautelar está agendado para ocorrer entre os dias 26 de setembro e 3 de outubro.

Atuação inconstitucional e ilegal
A ação impetrada pela AMIES destaca que a atuação dessas IES municipais tem contrariado diretamente preceitos fundamentais da Constituição Federal, como a gratuidade do ensino público, a competência privativa da União para legislar sobre educação e os critérios de autorização e avaliação de qualidade dos cursos, além de comprometerem a coordenação nacional da formação médica vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Para a AMIES, o que se observa é a consolidação de um modelo de atuação híbrido e irregular, no qual instituições públicas municipais agem como se privadas fossem: cobram mensalidades, expandem a oferta para outros territórios e não seguem as normas do sistema federal de ensino, configurando violação direta à jurisprudência do próprio STF.

Essas IES municipais, ao se beneficiarem de um regime tributário e regulatório diferenciado, acabam por praticar concorrência desleal com as instituições privadas legalmente submetidas ao sistema federal. Além disso, essas instituições atuam em desconformidade com a Constituição Federal (em diversos artigos); a Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional); a Lei 12.871/2013 (Lei do Mais Médicos); e o Decreto 9.235/2017, que dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação das IES e dos cursos superiores de graduação e de pós-graduação no sistema federal de ensino.

Entre os casos mencionados na ação, destacam-se o da Universidade de Taubaté (Unitau), em São Paulo; do Centro Universitário de Mineiros (Unifimes) e da Universidade de Rio Verde (UniRV), em Goiás. Em comum, essas instituições oferecem cursos pagos de medicina em cidades diversas de seus municípios-sede, sem autorização federal e com base apenas em atos de sua direção e pareceres dos respectivos conselhos estaduais de educação. “Tal prática representa uma afronta à Constituição Federal, pois combina elementos de natureza privada, como a cobrança de mensalidades e exploração da educação superior fora do território municipal; com o uso indevido da prerrogativa pública de integrar o sistema estadual ou municipal de ensino, inclusive se beneficiando de um regime tributário diferenciado, que resulta em concorrência desleal”, salientou o presidente da AMIES, Moses Rodrigues.

Ao acionar o STF, a AMIES reforça seu compromisso com a legalidade, a qualidade da formação médica e a isonomia regulatória no ensino superior brasileiro. A entidade representa instituições privadas de capital fechado que atuam dentro do sistema federal de ensino e realizam altos investimentos para atender às exigências regulatórias, incluindo a participação em chamamentos públicos para a criação de cursos de medicina. “O cumprimento da legislação por todos os agentes do setor é fundamental para garantir o princípio da isonomia, que é a base da igualdade perante a lei. Para que esse princípio seja efetivo, é necessário que a legislação seja aplicada de maneira uniforme e imparcial a todos os agentes e instituições que atuam no setor, inclusive para fins de garantir o equilíbrio do mercado”, afirmou o consultor jurídico da AMIES, Esmeraldo Malheiros.

Para a AMIES, a manutenção das restrições à expansão irregular e a reafirmação dos limites territoriais de atuação dos municípios já representam um avanço importante no combate à concorrência desleal. “A AMIES aguarda a apreciação da ADPF pelo Plenário, confiando na atuação da Corte para restabelecer a segurança jurídica, o respeito à Constituição e a equidade no setor da educação superior”, salientou a secretária-executiva da AMIES, Priscila Planelis.

Foto: Fellipe Sampaio/STF